Continuamos aqui na Little Stories com o nosso projeto "Essa Pessoa". Nesse episódio, contamos a história do Luis, que registra em seus rolês diários os cantores e bandas da cena musical da Vila Madalena. Queríamos falar um pouquinho sobre a história do Luis em um post aqui no blog e percebemos o óbvio: o melhor texto sobre ele é o que a jornalista Lígia Scalise nos apresentou quando trouxe a ideia de produzirmos um episódio com essa lenda viva da Vila. Adoramos, claro, e fizemos o minidoc. Por isso, o convite é duplo: assistam ao novo episódio do projeto "Essa Pessoa" e aproveitem para ler o delicioso texto de Lígia.
Com vocês, o Luís, apresentado por Lígia:
“O Luís é uma figura muito interessante. No auge dos seus 65 anos, ele é visto nas noites pelos bares da Vila Madalena, vestido com seu chapéu branco de bamba. Ora está dançando forró ou samba, ora está fazendo um vídeo dos músicos e do lugar, segurando firme seu celular na mão - ele posta tudo em tempo real.
A figura dele sempre me chamou a atenção. Mas, ao saber da história de vida dele, fiquei ainda mais fascinada: o Luis tem uma vida dupla! Vou explicar, começando pelo início: Luis nasceu na Espanha, mas foi criado no Brasil desde bebê. Ele se formou médico veterinário e construiu seu empreendimento de sucesso: um hotel para cães, localizado na zona rural de Itapecerica da Serra, SP. Foi na tranquilidade do sítio que ele e sua esposa, casados há 30 anos, criaram os dois filhos. Até que os meninos cresceram e passaram na faculdade em São Paulo, capital. Para facilitar a logística dos filhos, a família se mudou para o bairro da Vila Madalena. Isso aconteceu há 8 anos e é um ponto muito importante na história de Luis!
Acontece que, lá no sítio, ele tinha um espaço reservado onde passava suas noites - após o trabalho - escutando seus discos de música brasileira. Ele ama samba de raiz, forró e bossa nova, e era isso que ele fazia praticamente todas as noites. Só que, ao se mudar para o novo endereço, um espaço bem menor, a família passou a reclamar das músicas altas que Luis tanto escutava. Foi então que ele decidiu sair andando pelo bairro da Vila Madalena para ouvir música ao vivo. Afinal, se não podia escutar em casa, iria escutar na rua e voltaria até meia-noite para dormir - sem atrapalhar seu trabalho de veterinário no dia seguinte.
E, de tanto passar de bar em bar, ele ficou amigo dos gerentes e donos de bar, além dos músicos e clientes assíduos. Luis encontrou nisso uma paixão e começou a gravar vídeos dos músicos para mandar para os seus amigos mais próximos. Os vídeos serviam de convite, de registro e de carinho para os amigos. Ele enviava o material pelo WhatsApp, sempre empenhado em divulgar as atrações do bairro.
Até que uma amiga sugeriu a Luis que fizesse um perfil no Instagram para divulgar a programação musical de um jeito mais fácil. Ele nem sabia mexer na rede social, mas ficou todo animado! Em janeiro de 2020, nasceu o perfil @movidavilamadalena. Nasce aqui também o novo Luis: produtor musical do bairro.
“Movida” é uma homenagem ao hábito espanhol de passar de bar em bar, e Luis levou a sério seu novo hobby: de terça a domingo, das 20h às 00h (pontualmente) ele faz sua peregrinação musical, de bar em bar, divulgando a música e os músicos da noite.
Sextas e sábados são os dias mais agitados. Luis chega a passar em 15 bares (ele marca seu rolê em quilometragem, é um barato!). Já nos dias da semana, ele se permite ficar mais tempo curtindo os bares - mas tudo depende se está gostoso para dançar. (Ele convida todas as mulheres para dançar - e adora dizer que não faz distinção!).
Um ponto que eu gosto muito nessa história é que a virada de chave na vida do Luis acontece aos 60 anos. Ele diz que sempre foi um cara retraído, muito tímido, e que não sabia dançar. Nem vida social ele tinha! Só que, depois dos 60, e ao criar esse perfil no Instagram, ele conta que sua cabeça se transformou! “Comecei a pensar mais em mim e naquilo que me dá prazer. A vida passa muito rápido e eu quero aproveitar! O Movida Vila Madalena me trouxe uma alegria que eu não sei nem como explicar! Por conta dele, aprendi a dançar, fiz muitos amigos e me sinto bem divulgando gratuitamente o trabalho de tantos músicos da noite paulistana. Minha esposa não gosta do meu hobby (ela não bebe e não dança), mas teve que aprender a aceitar esse meu lado também. Só furo minha programação em caso de doença. Senão, mesmo que esteja chovendo canivete, eu vou para o rolê”, conta. Um dos filhos de Luis, inclusive, já ganhou o apelido de “movidinha” por frequentar os bares do bairro tal qual o pai.
Luis tem muitas histórias para contar e muito amor pelo que faz - dá para notar pelos olhinhos brilhantes e pelo sorrisão de levantar bochecha que ele tem. (Ele tem uma carinha de menino sapeca!). Quem vê o veterinário e dono de hotel para cães de dia, não imagina a rotina boêmia do ‘produtor cultural e dançarino’ da noite! E quem o encontra pela noite, nem imagina toda a história que o levou até ali. Ele é uma figura muito interessante!”
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